Ensaios Filosóficos:
Obra completa.
SEXTA EDIÇÃO AMPLIADA
Acostumados a agir e pensar automaticamente, nós nos dispensamos diariamente da tarefa de pensar. Tal dispensa ou recusa nos equipara a autômatos programados a responder ou corresponder a estímulos ou apelos. Inconscientes de nosso lugar no mundo, seríamos ainda capazes de pensar? E mais, seria possível ainda, num mundo dominado pela técnica e pelas tecnologias, algo assim como a liberdade ou, pelo menos, o pensamento sobre a liberdade? Paradoxalmente, diante da falta de pensamento e da falta de liberdade, somos obrigados pelos fenômenos mesmos, neste caso pelo fenômeno da ausência de pensamento e de liberdade, a pensar e a vislumbrar, pelo pensamento sobre a liberdade, alguma forma de liberdade.
ONTOLOGIA FENOMENOLÓGICA: UMA ONTOLOGIA POSSÍVEL, UMA METAFÍSICA POSSÍVEL.
“Ser e pensar é o mesmo”, pensava Parmênides.
Heidegger, como é de seu feitio fenomenológico, se apropria desta frase supostamente simples e supostamente misteriosa, e a reinterpreta à luz do pensamento fenomenológico.
O que é pensamento fenomenológico? O que é fenomenologia?
Fenomenologia é uma “logia” (estudo, pensamento) atípica: a fenomenologia, diante da óbvia impossibilidade de se conhecer ou compreender ou ter acesso às coisas mesmas (realidade essencial, essência), metodologicamente, suspende o juízo (julgamento) sobre a realidade (ou não-realidade) das coisas, do ponto objetivo e subjetivo.
A esta suspensão do juízo, sobre a realidade substancial e objetiva das coisas, chamamos de orientação fenomenológica.
O juízo comum e supostamente natural sobre a realidade e essencialidade das coisas é chamado de orientação natural.
A fenomenologia combate (suspende) a orientação natural: tal orientação natural é uma suposta (e pressuposta) pretensão de uma realidade objetiva e legalizada (legislada) por regras ou leis também supostamente naturais (objetivas).
A orientação fenomenológica, enquanto método e modo de pensar (livre), exige uma desconstrução, uma desnaturalização, um desaprendizado, em prol de um recomeço do pensamento sobre o que se nos aparece (fenômeno) de forma também livre.
Para tanto, se faz necessário abandonar todas as pretensões de verdades fixas (leis, causalidade, necessidade).
Isso significa que (e precisamos fazer esta advertência de antemão): para se compreender o que é a fenomenologia e para se estudar o método fenomenológico, se faz necessário (decisiva e peremptoriamente, sine qua non) FAZER fenomenologia. Não se pode compreender fenomenologia ou o que é fenomenologia sem fazer fenomenologia. Fenomenologia é, antes de tudo, um fazer, uma tarefa, um expediente de pensamento.
A ciência não pensa. Heidegger disse isso.
Isso não significa que a ciência não pense ao seu modo (âmbito de domínio): mas os modos de ser e pensar não são ser nem pensar, em sentido estrito. Se somente a filosofia se ocupa de pensar o ser, isso também não significa que a filosofia é superior em relação aos modos de pensar (ontologias regionais: ciência, antropologia, psicologia etc); questões desta natureza já são questões de ontologias regionais, como a ética. A filosofia se ocupa somente das questões do ser. Bem e mal, melhor e pior: são questões de juízos (julgamentos) de valor (ética). A filosofia se ocupa somente do ser e da verdade (alétheia): tudo o que é é verdadeiro; contudo, tudo o que é jamais pode ser falseado (julgado).
Pensar é pensar algo (objetivação do que se pensa). Este algo que toma forma com e após o pensar é objeto de consciência. Consciência (ciência, saber, Wissenschaft) é sempre sempre consciência de algo.
FORMALIZAÇÃO:
Ser é pensar (ser e pensar é o mesmo):
SER = PENSAR
Ser e pensar são uma e mesma coisa: pensar é realizar o ser. Somente a filosofia pensa (neste sentido) o sentido do ser. Somente a filosofia questiona o ser (o que é). Este questionar já é abertura de ser, já é ser.
SER = PENSAR significa que ser e pensar são sinônimos. O saber e questionar o ser é um saber específico e exclusivo da filosofia. Neste sentido, a ciência não pensa. Pensar é pensar o ser.
Isso nada tem que ver com questões hierárquicas em relação à superioridade ou inferioridade deste ou daquele pensar.
Pensar o ser é privilégio único e exclusivo da filosofia.
Assim, a história do ser (do pensar, do questionar) é a própria história da filosofia.
Ser é tempo.
SER = TEMPO
Ser é pensar e ser é tempo.
Ser é a experiência do tempo (no mundo da consciência: nem objetivo, nem subjetivo) enquanto realização de SER, TEMPO e PENSAR.
Sem a compreensão disso não se pode compreender a fenomenologia sui generis de Martin Heidegger.
Para se compreender a fenomenologia de Heidegger é preciso e decisivo a leitura e compreensão de:
- Aristóteles: alétheia;
- David Hume: não sei se amanhã o sol nascerá;
- Kant: tempo e espaço e suas leis correlatas são potências do sujeito transcendental, tais potências se referem aos fenômenos e não e nunca às coisas mesmas (essências, realidades);
- Hegel: a história, no fundo, é a história da liberdade.
- Wittgenstein: o mundo é a totalidade de fatos (história: somente o homem tem história), não é a totalidade das coisas;
- Descartes: penso, portanto, existo. Penso, logo SOU.
- Husserl: o mundo da consciência...
Como posso saber se estou aprendendo a pensar fenomenologicamente?
Basta começar a leitura de Ser e tempo e, quando e se eu me antecipo ao texto, isso significa que eu estou aprendendo a pensar (fenomnologicamente).
Não é estranho e curioso e escandaloso eu conseguir me antecipar a um texto que não é formalizado segundo as égides da lógica formal, segundo os ditames da filosofia (historiográfica) tradicional?
Sim, de fato, é escandaloso, é espantoso.
Claudio Donato
29-03-2017
Número de páginas | 282 |
Edição | 1 (2017) |
Formato | A4 (210x297) |
Acabamento | Brochura |
Tipo de papel | Offset 75g |