As almas das palavras vivem depois que suas formas mudam. Este elemento espiritual das palavras sobrevive com a literatura.
Para os antigos habitantes da Mesopotâmia, um enterro envolvia muito mais que o morto. A última morada era mobiliada com objetos tanto mais preciosos quanto mais importante e rico fosse o extinto. Animais, guardas e empregados formavam um cortejo para acompanhar o falecido na viagem sem retomo. Nada de extraordinário o esperava além. Tudo continuaria como na terra, de outro modo, talvez. O morto nem se acabava nem se transformava em ser divino.
Essas concepções remontam ao ano 3.000 a.C., mas só se tornaram conhecidas na década de 30, após a descoberta de túmulos em Ur, na Caldeia, hoje parte do Iraque. Também puderam ser conhecidas graças à literatura deixada pelos sucessivos habitantes da Mesopotâmia — assírios, caldeus, babilônios, sumerianos. Esses textos literários revelam temores com relação aos deuses, que, embora congenitamente bons, tinham imprevisíveis repentes de cólera.
Os deuses regiam as forças da natureza. Comandavam raios, ventos, rios, céu e terra, sol e lua. Eram representados sob forma humana, em formas de animais, como eram os deuses do antigo Egito. Às vezes, acompanhava-os um animal; o leão, por exemplo, aparecia ao lado da deusa Ishtar, mas com um valor meramente simbólico ou metafórico. Não só na forma exterior os deuses se assemelhavam aos homens, mas também na condição, com a diferença de que não sofriam a morte. Padeciam, porém, as mesmas paixões, os mesmos sentimentos, as mesmas aflições humanas.
As divindades de maior prestígio entre os assírio-babilônios eram: deus-lua, Sin; o senhor da terra, Ea; e o planeta Vênus, Ishtar. Protegia a Babilônia Bei Marduk e a Assíria, Ashur.
Os deuses e mitos fenícios tinham estreita relação com a terra, pois os fenícios haviam sido agricultores, antes de se dedicarem ao comércio e à navegação. Suas principais divindades eram El, criador de todas as coisas, senhor dos deuses e dos homens, e Baal, deus do furacão, da tempestade e da chuva, que praticamente dominava a natureza, embora com auxílio de Dagon, que protegia o trigo, e de Mot, que vigiava as messes e a maturação dos frutos. Ao lado de Baal destacava-se Astarte, a deusa da fecundidade.
Segundo textos posteriores ao século XV a.C., vários deuses, alternadamente, morriam e ressuscitavam, o que correspondia ao eterno renascer da natureza. Os cartagineses e os fenícios sacrificavam crianças aos deuses para aplacar sua ira. Talvez por esse sacrifício (molk), os hebreus atribuíram aos fenícios um deus Moloc.
Os deuses e cultos da Roma antiga provinham, na maioria, da Grécia e também dos povos nativos da Itália.
Destes últimos foi que os romanos herdaram o culto da fecundidade, dos mortos, do lar e da família. As divindades gregas apenas mudaram de nome em Roma, a partir do deus supremo, que na Grécia era Zeus. Aliás, entre os romanos havia muitos Júpiter: um Júpiter Ferétrio, guardião da árvore na qual se penduravam os despojos dos inimigos. Um Propugnator, que defendia combatendo. Um Victor, que vencia as batalhas, e vários outros.
Normalmente camponeses, os romanos cultuavam ainda os patronos dos rebanhos e dos campos. Ofereciam-lhes animais, vinho e incenso antes das colheitas para granjear sua proteção. Alguns desses deuses rurais ou associados à agricultura mudaram de atividade com o tempo, como Marte, deuá da guerra, que no princípio fôra protetor das messes
Tudo o que se sabe da mitologia nórdica vem através das sagas, contos que louvavam os heróis. Surgiram, segundo parece, por volta do século X, na Islândia, onde segja quis dizer narrar. As principais famílias islandesas, desejosas de imortalidade, encarregavam os sgnamenn, homens de extraordinária memória e talento narrativo, de contar os feitos de suas estirpes. Os reis noruegueses depois seguiram o exemplo. Mais tarde, a essas tentativas de crônica acresciam-se elementos fantásticos e míticos, e os heróis dos antigos chefes misturaram-se com os deuses.
O centro do mundo era Midgard, o lar do homem. A casa dos deuses, Asgard. Em torno das duas moradas, o mar. Além do mar, a terra dos gigafites e da Grande Serpente. Odin (também chamado Wotan) governava os deuses e os homens e conhecia todo o passado, presente e futuro. Sua mulher, Frigga, recompensava as boas esposas e donas de casa com um fio de sêda tecido por ela no tear dourado. Seu filho Thor comandava o trovão, que fabricava a golpes de martelo. Loki, deus do fogo, era conselheiro e inimigo de seus pares.
Em Asgard ficava o Valhala, para onde as valquírias, mulheres guerreiras, levavam os heróis mortos em combate. Ali ficavam, entre lutas e festas, à espera da ressurreição do mundo. Antes, porém, teriam de enfrentar os gigantes, os monstros, a Serpente e o filho de Loki. Os heróis seriam vencidos e a terra ficaria tôda escura e fria, até a vida recomeçar.
No vale do rio Indus viviam os mais antigos habitantes da Índia. A partir de seus sinetes, selos e cerâmica, parece que eles adoravam uma deusa-mãe e um deus semelhante a Siva. E veneravam ainda o touro, a cabra e o crocodilo.
Os arianos, que, por volta de 1.500 a.C., invadiram a Índia a partir do Norte, tinham vários deuses: o céu, o sol, a terra, adorados sob forma humana. Em seu louvor escreveram hinos e cânticos, coletados nos Vedas, como são chamados os livros sagrados do hinduísmo. O mais velho é o Rig (real) Veda, que descreve a criação do universo. O Rig Veda sugere ainda que existia um só deus, desdobrado em vários aspectos: o céu, pai do crepúsculo, Vayu (o vento), pai dos deuses da tempestade. Soma, pai das plantas, e Sarasvati, dos rios. Indra, filho da verdade, e Agni, filha do poder. Geralmente, eram benignos e amavam a honestidade e a retidão.
No desenvolvimento da religião hindu, essa realidade espiritual assumiu formas definidas e poderosas. Dirigiam o universo, criado a partir do nada, Brama, Vishnu e Siva. Vishnu descia à terra como peixe, tartaruga, leão ou duende. Foi também humanizado como herói chamado Krishna, que entrou na literatura hindu. Siva destruía e criava, além de presidir a dança. Sua mulher, Sakti ou Kali, era a deusa-mãe. Mas Brama dirigia toda esta trindade.
Deuses e homens estavam em perene luta contra os demônios, soturnos espíritos que habitavam o ar ou a terra e possuíam mágicos poderes. No Ceilão, o senhor dos demônios era Ravana, personagem principal de uma antiga lenda hindu.
A religião da China antiga era tão bem organizada e hierarquizada como a própria sociedade chinesa. O direito do culto era privilégio dos patrícios. Os plebeus recebiam benefícios indiretos, sem participar ativamente. Seu universo mítico era povoado de deuses, demônios, espíritos maus Skuet) e almas penadas (Zi). Sobre todos reinavam o Senhor do Alto, Chang-Ti, deus do céu, o Soberano Terra, Heu-t'u, deus do solo do reino, e os antepassados reais.
Chang-Ti vivia num palácio, na Grande Ursa, e governava por meio de delegados, cuja importância aumentou sob a dinastia dos Tcheu. Durante o solstício de invemo (tempo em que o Sol se encontra mais distante do equador, sendo os dias curtos e as noites longas), o imperador oferecia sacrifícios ao deus do céu. A cerimônia era ao ar livre, nas terras de mármore do Templo Celestial de Pequim.
Heu-tu presidia as investiduras e zelava pela prosperidade do reino. Cada feudo possuía dois deuses do solo, hierarquicamente inferiores a Heu-t'u: um particular e um coletivo. O primeiro era expulso e considerado morto quando mudava a dinastia. Mas continuava sendo venerado
Os antigos chineses acreditavam que seus antepassados sobreviviam como espíritos. Por isso, cultuavam-nos. Depois do funeral, colocavam na casa do morto uma placa e queimavam incenso. Aumentando o número de placas, as mais antigas eram removidas ao pavilhão dos ancestrais e guardadas por membros da família.
Número de páginas | 37 |
Edição | 1 (2018) |
Formato | A4 (210x297) |
Acabamento | Brochura |
Tipo de papel | Offset 75g |