Ao contrário do que o Ocidente per¬plexo imputa como quintessência do fanatismo, a consciência dos pilotos kamikazes — de unir-se à tradição do suicídio na derrota — nada tem de irracional. Tratava-se de defender o Japão.
Em outubro de 1944 o mundo era apresentado aos kamikaze, fruto do desespero militar japonês ameaçado, a pátria, as famílias em casa, deter o inimigo e inflingir-lhe as mais pesadas baixas. Tarefas infinitamente mais importantes do que a sobrevivên¬cia física individual. A possibilidade de transformar-se em um herói incandes¬cente era um privilégio. Os 2.198 pilotos que jogaram seu avião contra o inimigo eram todos voluntários; a lista de candidatos a kamikaze foi sempre maior do que o número de aviões disponíveis.
O suicídio voluntário não é um ato de desespero, mas de lucidez e abnegação rigorosas. Ele confere significação à toda a vida. A força de vontade que o suicida dá de si próprio expressa sobe¬rania e orgulho, revida o ultraje e expia o fracasso. A morte é triste e lamentá¬vel, mas o suicida não morre, se mata; desaparece, não sem um último res¬plendor que, como ele bem sabe, fasci¬nará os mortais e atestará seu devotamento à causa da sua morte voluntária, seja por amor, honra ou patriotismo.
O suicídio como enobrecimento surgiu na antiguidade japonesa. Os chefes po¬derosos dos primeiros clãs guerreiros, em seu enterro, eram acompanhados pe¬lo enterro compulsório dos parentes; um costume também registrado na Babilô¬nia, na índia e na China. A prática durou até o século V, quando o rei Suinin abo¬liu-o, substituindo familiares vivos por estátuas de terracota. Entretanto, o junshi — acompanhamento voluntário na morte — continuou. Os sentimentos que uniam o senhor e seus servidores, suserano e vassalos, o imperador e seus oficiais, o apego de homem para homem forjado em combates, era intenso.
Os sacrifícios não ganharam a guerra, mas deram trabalho aos americanos.
Número de páginas | 55 |
Edição | 1 (2017) |
Formato | A4 (210x297) |
Acabamento | Brochura |
Tipo de papel | Offset 75g |