Durante a reconquista do Reino de Nápoles, perdido para a Áustria com o Tratado de Utrecht que pôs fim à “Guerra da Sucessão Espanhola”, Luiz Henrique, um jovem português da Província de Trás-Os-Montes, se desertou das tropas de Carlos de Bourbon e ficou gravemente ferido durante a fuga, sendo encontrado desacordado por uma jovem órfã criada pelo tio em um mosteiro beneditino próximo a Fondi na antiga Via Appia sentido Nápoles-Roma. Era o dia 10 de maio de 1734 e como de fato o Reino de Nápoles havia sido tomado naquela madrugada, para não criar transtornos para a Santa Sé, o jovem português fugiu para a cidade de Terracina depois de ter seus ferimentos tratados pelos beneditinos e por Soraia que envolvida emocionalmente com o desertor decidiu seguir seus passos numa grande aventura de travessia da Espanha a cavalo depois de ficarem à deriva por quatro dias no Mediterrâneo e terem o barco em que viajavam destruído por uma tempestade a caminho de Marselha. Do relacionamento do jovem casal nasceu uma paixão avassaladora que ousou desafiar a barreira do tempo; porém, seguidos pelo temível “Quebra Ossos”, um desafeto de Luiz Henrique e braço direito de Carlos de Bourbon, após atravessarem a divisa com Portugal, “baixaram a guarda” imaginando estarem livres da perseguição. Dias depois da chegada ao Bairro Alto de Lisboa Soraia foi surpreendida pelo inimigo e, numa tentativa desesperada de fuga, sofre um terrível acidente que lhe custa, além da própria vida, também a do filho de apenas dois meses que levava no ventre. Desiludido com a perda dos dois maiores amores de sua vida Luiz Henrique parte para o Brasil e se embrenha nos sertões sem fim da Capitania de São Paulo após a descoberta de ouro no quilombo de “São Francisco de Paula do Ouro Fino” criado por “Santa Sombra da Meia Noite”, um frade beneditino desertor do Mosteiro de São Bento, perseguido pelas tropas de Simão Gago do Regimento de Milícias de Jacareí. Numa tentativa de encontrar respostas objetivas aos dilemas existenciais que afligiam sua alma, Luiz se aproximou de Iacina, uma jovem guaianá arrematada num leilão na Vila de São Vicente, através da qual tem os primeiros contatos com a filosofia milenar dos povos ameríndios em relação à existência humana e à imortalidade da alma. Envolvido afetivamente pela jovem aborígene, mesmo com as lembranças de Soraia ainda latentes em sua memória, Luiz desposou Iacina em uma cerimônia aos moldes tupi-guarani ministrada pelo cacique Îagûara com auxílio do pajé da aldeia tupinambá do “Mojiguaçu” ou “Grande Rio Que Serpenteia”. Na madrugada da noite de núpcias, Iacina, a jovem esposa guaianá é alertada em sonhos, pelo mesmo pajé, de que seu marido tinha um encontro marcado com a morte representada por uma cobra de chocalho incumbida de cumprir o pacto com o destino. Iacina, numa luta inglória, não consegue evitar que Luiz Henrique suba a montanha em direção à floresta “Ybyun” com o objetivo de traçar uma trilha de fuga para os garimpeiros quilombolas caso fossem atacados pelas tropas do coronel Simão Gago. Dito e feito, na manhã seguinte Luiz Henrique vai ao topo da montanha e é picado por uma cobra cascavel. Isolado na mata, sem um antídoto que pudesse reverter o potencial veneno, na manhã seguinte, vem a falecer nos braços de sua jovem esposa que, na noite anterior, em sonho, havia recebido uma nova mensagem do velho pajé tupinambá, a qual foi revelada ao marido em seus últimos segundos de vida: “Quando bebê jequitibá alcançar o céu, Soraia estará de volta para Luiz Henrique”. O jovem português é sepultado por sua esposa e por seus amigos à margem de uma trilha indígena no solo de terra preta da floresta das araucárias de “ybyun”, ao lado de um rebento de jequitibá-rei com cerca de dois anos de idade, deixando viúva sua esposa Iacina, a “Borboletinha de Asas Douradas”, conforme o significado do nome no idioma tupi-guarani. Duzentos e quarenta anos depois, exatamente no ano de 1974, um jovem estudante, filho de um fazendeiro da região, é surpreendido por uma experiência metafísica em uma estação ferroviária da cidade de Ouro Fino, no sul do estado de Minas Gerais. Uriel, com idade de dezessete para dezoito anos, aguardava uma tia na plataforma de desembarque quando cruzou com uma jovem aborígene portando um colar de sementes no pescoço e um cocar de penas em sua cabeça. Ao se fitarem, frente a frente, na porta do vagão de passageiros, Uriel teve a nítida sensação que já se conheciam há séculos. Passando por ele, a jovem seguiu direto ao quadro negro de avisos da bilheteria onde deixou uma mensagem escrita. Por alguns segundos, distraído com a tia, Uriel perdeu o contato visual e a mesma desapareceu como a névoa matinal sob os primeiros raios de sol. Sem alternativa o jovem estudante seguiu em direção ao quadro negro onde a misteriosa aborígene havia deixado a seguinte mensagem: “Bebê jequitibá alcançou o céu. Soraia está de volta. Procure tapi’i rapé, lugar onde a anta bebe água”. Sem encontrar nexo na frase escrita, Uriel regressou à fazenda dos pais onde perdeu uma bela noite de sono tentando desvendar o enigmático texto deixado no quadro negro da estação ferroviária. Dias depois, uma jovem de dezesseis para dezessete anos chamada Licínia, ao passar por uma trilha numa antiga fazenda de escravos por nome “Ibiúna”, que também era de propriedade da família de Uriel, percebeu uma roseira isolada próxima a uma restinga de mata. Ao tocar uma rosa, Licínia passou por uma intrigante experiência. Numa cena fantasmagórica viu um homem caído próximo a um riacho. Parecia desacordado e tinha um ferimento grave na parte superior do crânio. Licínia, muito assustada, gritou a mãe que veio em seu socorro e implorou para que a filha ficasse o mais distante possível daquele lugar sinistro que, provavelmente, se tratava de uma antiga sepultura. Licínia prometeu não se aproximar do local; porém uma força misteriosa a atraía para aquele ambiente místico ao qual retornaria uma hora mais tarde. No mesmo instante, Uriel, a pedido do pai, visitou a Fazenda Ibiúna para salgar os cochos e fazer a contagem do rebanho. Na falta de uma novilha, montou seu cavalo e partiu em direção ao bebedouro do gado, também conhecido como “poço das antas”, local onde, provavelmente, encontraria a tal novilha desgarrada deitada à sombra de um pé de cedro ou do centenário jequitibá-rei cuja copa, de tão alta, passava a impressão de estar tocando o céu. Licínia, levada por uma força misteriosa desobedeceu à mãe e seguiu rumo ao “poço das antas” tentando responder a uma pergunta que vinha das entranhas de sua alma: quem era aquele homem? Por que, mesmo desacordado, buliu tão profundamente com seus mais íntimos sentimentos? E ali, ao lado do imenso jequitibá-rei, Uriel e Licínia se viram frente a frente. Seus olhares se cruzaram, seus corações podiam ser ouvidos à distância. Envolvidos em um beijo doce e apaixonado, tiveram a sensação que já se conheciam há séculos, embora nunca tivessem se encontrado. Ao menos é o que eles imaginavam. Enquanto se beijavam, no alto do centenário jequitibá-rei um trinca-ferro desafiava uma orquestra de pássaros-pretos reforçada por pintassilgos e canários-da-terra.
ISBN | 978-65-89910-10-7 |
Número de páginas | 344 |
Edição | 1 (2021) |
Formato | A5 (148x210) |
Acabamento | Brochura c/ orelha |
Coloração | Preto e branco |
Tipo de papel | Offset 75g |
Idioma | Português |
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