No seu «Por que as bicicletas tocam violinos», começa a Sam I See com a preocupação nobre que «avista o pedaço de terra...» e que se sente magoada com os descasos do mundo. A essência da Poeta não é dar soluções, ela é por excelência uma Criadora de Arte, portanto, descrever a vida como ela é, eis a função de Sam! E de todos os Criadores! Expor o mundo interrogando! Da corrente poética estica o imagético para se perguntar o que é o amor, como se estivesse «do lado esquerdo da esquina», e dialogar com o fantasma, ainda assim, um interlocutor que ama. E que ama as Leis do algoritmo, essa coisa espantosa que é a sua natureza. A natureza da Matemática! Que explica a Lei da natureza e no entanto não existe. Onde está a Matemática? E se está, qual a sua consistência, a sua forma, etc.? Como se explica o mistério da Matemática, embora tão rigorosa na descrição da Natureza, mas que só existe na nossa mente? Essa é a tarefa dos filósofos e poetas! Compreender! Assim, uma mente poética como a nossa Sam I See, se debate com o coração também, que quer ser livre, mas que se amarra no amor. No fundo, a Humanidade!
Dessa sua poesia, poesia livre, se arcabouça na prosa poética, que é quase toda ela a estrutura que sustenta o livro. De resto, uma prosa poética sublime, que vale a pena ler.
«Águas profundas não são para qualquer um que diz saber nadar»
Pois não! Não é para qualquer um! É preciso saber enfrentar os abismos, as águas profundas, ser livre das amarras conjunturais que definem o nosso tempo, tempo de Falências Morais, onde em particular o Brasil tudo descamba na impunidade (ou quase) e na descrença dos valores da Sociedade, a persistência das ondas nefastas que mergulham e afogam os cadáveres, que, ainda que respirem oxigénio, já “mortos” e bem enterrados nos abismos oceânicos, desde 1500 a Casa Grande a escravizar a Senzala, e sairmos ilesos a essas Tempestades e manter os Valores. É preciso ser Grande de Alma!!! E aos Valores Poéticos, tão caros aos escrevedores de versos! E Sam I See é fundamental, na sua poesia, a entrega da sua alma à musa poética, e longe dessas ondas nefastas que varrem o país!
Sabe-se que a poesia e filosofia têm uma relação de linguagem profunda, como Heidegger propôs, e também de amor-ódio! E como, através da poesia é possível chegar à essência do Humano! Num dos seus tratados, escreveu Heidegger:
«O homem se limita à realidade corrente e passível de ser dominada, mesmo ali onde se decide o que é fundamental. E se ele se decide transformar, se apropriar e assegurar o caráter revelado do ente nos domínios mais variados de sua atividade, ele, contudo, procura as diretivas para tal nos estreitos limites de seus projetos e necessidades correntes.»
Ou seja, a filosofia e a poesia estão ao serviço da linguagem. E é curioso o seguinte poema de Sam I See:
«Às vezes nessa vida o sabor de mel tem gosto de limão».
Embora não pareça, a poeta se arrisca, e bem, na gélida realidade da matemática, dos confins rotativos dos algoritmos, porque se sai bem, que só os bons poetas sabem! E nessas incursões, «Ciclos de possibilidades/Perante a benevolência irônica/do criador de um alvo em especial ∞»
E no entanto, havia sido o empenho de Sam na poesia-filosófica que mais me encantara. Fora a partir dessa realidade que me fizera à “estrada”, digamos assim, e construído esse texto na base da sensibilidade da nossa poeta! E depois, trabalhado e melhorado até chegar a esse que o estão a ler.
E depois, se apraz perguntar, o que é suposto ser lúcido neste mundo que nos coube em azar? Mundo tão nefasto, mundo de descrédito, e tão ferozmente de falência moral? Em especial, no Brasil? Brasil onde viu a poeta construir esse seu «Por que as bicicletas tocam violinos»? E num desabafo contundente, «Confusa ou incerta/em idas e vinda».
E claro, pergunta-se se a poeta quer-se salvar deste redemoinho de insanidades. Procura Sálem e diz que está aqui! Que a salve dos seus ‘eus’!
E a metafísica? O que lhe inquieta, que Deus está de férias? «Ver o milagre sepultado/sem lápide de margaridas»
E canta ao poeta e Mestre Filampos Kanoziro, que eu desconhecia, verdade seja dita, poeta das «Palavras desconstruídas».
E como, à pala da nossa poeta, «Saiu porta fora, sem olhar para trás, apenas carregando a nudez da dor, seguindo...», eu vos deixo com esse livro, livro deveras importante para a nossa caminhada solitária que é a leitura, e aprendermos a vida ao som da poesia de Sam I See.
Finalmente, «Porque as bicicletas tocam violinos», ao Alexandre Herculano vos entrego, retirando-me do palco, deixando a poeta brilhar no seu protagonismo:
"O férreo pé da dor,
E o hino da oração,
Em vez de irado canto,
Me pede íntimo ardor?"
Luís Altério
Engº de Minas e Autor da novela Cidade Bruta
Número de páginas | 174 |
Edição | 1 (2016) |
Formato | Pocket (105x148) |
Acabamento | Brochura s/ orelha |
Coloração | Preto e branco |
Tipo de papel | Offset 75g |
Idioma | Português |
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