EXPLICAÇÃO
Chutaram a cabeça da estátua do Carlos Drummond em Copacabana, para roubar-lhe os óculos de cobre. Desde que foi colocada lá no banco da praia, de costas para o mar, seus óculos já foram roubados onze vezes.
Na adolescência, em Ipanema, a galera costumava se encontrar na Rua Conselheiro Lafaiete, a duas quadras do número sessenta, residência do poeta. Nesta época não o víamos pelos arredores, provavelmente dormia com as galinhas, ou ficava escrevendo, não importa.
Alguns anos à frente minha Mãe Marlene foi estudar na Bélgica e levou minhas irmãs; eu e o Pai ficamos uma temporada no apartamento dela, na Rua Antônio Parreiras. Por este tempo eu já havia engrenado na escrita e a presença do poeta pelos arredores não era despercebida.
Por vezes eu o vi atravessando a Visconde de Pirajá; de óculos, calça social, camisa para dentro e suéter, mesmo estando sol. Ele vinha andando por dentro e alçava a avenida pela Rua Jangadeiros, como quem vai para a La Veronese, Rua Visconde de Pirajá, 29.
De fato, era para o prédio ao lado que ele ia, no horário sempre pouco depois do descanso do almoço, por volta das duas horas da tarde.
Nunca vi ninguém incomodar o poeta na rua. Andava bem vestido, carregando livros e pastas, com pinta de intelectual atarefado.
Aparentava calma e concentração, andava de cabeça ligeiramente baixa. Naquela época não havia rede social e nem a brutal exposição de fotografias e imagens; os que o reconheciam não lhe incomodavam; enfim, o Carlos andava tranquilo, não havia pedras no caminho e calmo adentrava o prédio ao lado da Veronese.
Lá em casa se dizia à boca miúda que uma aparentada era vizinha de porta da amante do poeta, talvez a bibliotecária Lygia Fernandes; então eu imaginava onde ele estava indo. Isso não tinha nenhuma importância até quê, antes de ontem, vimos estarrecidos, na televisão, um vândalo cracudo dando um coice nos óculos do Drummond.
Para quem gosta de poesia, de pessoas, e do Rio de Janeiro, isso machuca, mancha a cidade, afasta o turismo, mingua a economia.
Chutar a estátua de bronze do poeta é o fim da picada para a Cidade Maravilhosa, berço do samba e das lindas canções que vivem n’ alma da gente. Ah! Se o Ferreira Gullar souber disso vai ficar danado e processar o Estado.
Confesso nunca ter sido leitor assíduo do itabirano, embora aprecie parte da obra; para leitura prefiro os clássicos portugueses, poetas iconoclastas com ímpeto e tempestade; gosto de Navio Negreiro. Albatroz! Albatroz! Gosto do Manuel Bandeira, do Castro Alves, Maiakovski, Guerra Junqueiro e Camões.
Drummond sem óculos reúne seleta de poemas não publicados acrescidos da comédia inacabada, em versos, A concubina imaculada.
Os versos intitulados Shawnodese brincam com o poema famoso “Balada do amor através das idades”, e a razão do título é indignação.
Número de páginas | 96 |
Edição | 1 (2017) |
Formato | A5 (148x210) |
Acabamento | Brochura c/ orelha |
Coloração | Preto e branco |
Tipo de papel | Polen |
Idioma | Português |
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